Atravessar
a pradaria e descer o rio, escalar a montanha, sentir as pedras ásperas e
escaldadas nas mãos feridas, do cume olhar para o vale, para os pastores e os rebanhos
e as tendas dos nómadas, os cento e cinquenta cavalos, os bancos de areia
branca, em torno de Damavand flutuam nuvens leves (ou fumo), o sono e o calor
dos sonhos, e ao fim do dia correr o rio a vau e lançar as canas de pesca. Era
isto, a vida!
O
que foi que mudou desde então? Erguemos devagar a mão a cerramos o punho.
Impossível cerrar o punho. O gesto é fraco, choco, e nas costas, nos joelhos,
na nuca sentimos já a terrível prostração da acédia, uma doença pior que a
malária. As mãos estão húmidas, falar é um esforço desmedido. Levanta-te e
caminha! O coração bate depressa, e seguimos pela margem do rio mais depressa
ainda, para não cedermos à tentação de nos atirarmos ao chão e chorarmos de
cansaço e desespero. Ah, aqui não se chora. É pior, muito pior. Aqui estamos
sós.
Annemarie
Schwarzenbach, Morte na Pérsia
(Tinta-da-china, 2008)